Ao nos comprometermos
com o estudo sobre a existência de Deus na Filosofia de Tomás de Aquino, temos
que nos inclinar aos problemas que a "existência" carrega em si para
que possamos, de modo mais claro, entender que ligação a existência e Deus
processam-se em um universo ontológico, todavia considerando mais este aspecto
que o teológico.
Será que podemos
contemplar Deus imediatamente pela inteligência? Se esta resposta for sim,
então Deus é uma verdade evidente, mas caso não possamos realizar tal coisa, temos
um problema que, para Tomas de Aquino, se resolve com a demonstração da
existência de Deus com outras verdades que esclareceriam a primeira. Mas será
que tentando fundamentar uma verdade com outra não cairíamos em um processo de
regresso ao infinito? Ora, uma verdade em si deveria ter a prova de sua
existência em si sem precisar recorrer a outras verdades, pois neste processo,
em um ponto de vista mais cético, não teríamos quais quer razões para crer, a
não ser pela fé, que todas essas verdades bastam em si para nos atribuir certas
"certezas".
Atribuindo a Deus o
advento do Uno pelo qual todos os entes derivam, temos que investigar e
conhecer, na medida do possível, este objeto que estamos nos debruçando de modo
a buscar evidências se o mesmo existe de fato.
Se neste principiante
momento não podemos afirmar com clareza sobre a existência de Deus, logo, temos
que buscar alternativas que, segundo Pe. Leonel Franca, nos excluem do erro de
afirmar algo que não vemos claramente como uma verdade. Mas por outro lado, um
axioma dispensa qualquer necessidade de demonstração, o que segundo Wilfrid
Sellars seria composto por uma autoridade/credibilidade
ou simplesmente por algo não-inferencial.
No entanto,para
Sellars, existem crenças básicas conhecidas não-inferencialmente, e estas
crenças basilares são apreendidas pela experiência sensível. Ex.: "Esta
parede é branca". Mas como eu sei que esta parede é branca? Ora, porque eu
estou vendo. Mas para que eu saiba
que esta parede é branca eu tenho antes que saber que existe uma parede e,
consequentemente ou posteriormente, que ela é branca. E, não obstante, mais do
que regras gramaticais, não basta que tenhamos experiências de coisas
distintas, mas também que tenhamos consciência de coisas distintas. Com isto
deduz-se que há episódios internos que não exigem formação de um conceito, são
representações evidentes em si. Mas será Deus um conceito, e se for será ele
abstrato ou simplesmente um episódio interno como uma sensação?
Voltemos agora ao
problema das verdades em si. Para tanto, estes axiomas que garantem a
"certeza" que elimina a demonstração podem ser problemáticos, como
dito anteriormente, se observados em um ponto de vista mais rigoroso.
Primeiro nos
questionaremos sobre o que podemos tomar como significado de ver, e depois como esses relatos
observacionais se relacionam como dados dos sentidos.
Estas verdades mais
acessíveis, das quais recorreremos para uma melhor compreensão acerca de Deus
(a verdade em si), que esclarecem a verdade axiomática (Deus) são a prova de
que os dados inferencialmente tidos e processados pela inteligência se
comportam como degraus para a última instância, isto é, Deus. Todavia essa
verdade axiomática pressupõe de outras crenças para subsistir, o que exclui a
possibilidade de ser uma verdade em si. Portanto se fossemos recorrer a outras
verdades para embasar uma verdade entraríamos em um regresso epistêmico sem
garantias de credibilidade alguma.
Na proposição
"Deus existe", podemos considerar que, segundo Tomás de Aquino, se
alguém ignorar a definição do predicado e a do sujeito, a proposição será
evidente por si e em si mesma; mas não para quem ignorar o sujeito e o
predicado da proposição. De acordo com tal afirmação, há a consideração de que
a predicação é evidente ao sujeito e, para tanto, Deus é o Uno e Dele tudo
provém, todos os ademais entes, inclusive a existência que só existe porque
antes Deus existe, portanto Deus é a existência.
Mas é necessário uma
demonstração, pois para nós isso não
é imediato. Esta demonstração nos vem por intermédio de outras
"verdades" que pressupõe a proposição "Deus existe". Não
obstante, se tal evidência não é óbvia, pode ser negada por nós.
Admitir que só as
coisas sensíveis nos são imediatamente acessíveis é tornar impossível a
existência de Deus, pois o a posteriori
retira totalmente a possibilidade de Deus ser um episódio interno que não exige
formação de um conceito. Se formos buscar sob causas e efeitos a sua existência
no mundo sensível cairíamos em um abismo cético, pois como vimos, há problemas
consideráveis para conceber o objeto do conhecimento epistemológico.
O problema aristotélico
de partir dos particulares para compreender o geral é aplicado por Tomás de
Aquino na tentativa de afirmação de que Deus é uma evidência se considerarmos
que está presente em todos os entes, logo ele existe e faz parte do Uno que se
distribuiu entre os entes. E para formar o conceito de Deus, precisa-se de
recorrer aos entes sensivelmente apreendidos.
Mas será que nossos
sentidos são confiáveis a ponto de podermos pressupor pelos dados que nos são
apreendidos a existência de uma instância tão superior como Deus, o Uno?
Segundo Edmund Gettier,
o conhecimento empírico é uma fonte não muito confiável. E tudo que possamos
entender como conhecimento pode ser posto em cheque se postos em condições
rigorosas de análises dos fatos empiricamente experienciados. As condições de
crença verdadeira justificada nem sempre podemos considerar conhecimento, muito
menos algo tão abstrato como tem se mostrado saber o que é Deus.
Gettier pensa que estes
dois exemplos conseguintes mostram que um indivíduo pode ter uma crença
verdadeira justificada mas não ter conhecimento. Se Gettier tiver razão, então
as três condições indicadas pela teoria da crença verdadeira justificada não
são suficientes.
Eis um dos exemplos de
Gettier: Smith trabalha num escritório. Ele sabe que alguém será promovido em
breve. O patrão, que é uma pessoa em quem se pode confiar, diz a Smith que
Jones será promovido. Smith acabou de contar as moedas no bolso de Jones, encontrando
aí 10 moedas. Smith tem então boas informações para acreditar na seguinte
proposição:
a) Jones será promovido e Jones tem 10
moedas no bolso.
Smith deduz, então,
deste enunciado o seguinte:
b) O homem que será promovido tem 10 moedas
no bolso.
Suponha-se agora que
Jones não receberá a promoção, embora Smith não o saiba. Em vez disso, será o
próprio Smith a ser promovido. E suponha-se que Smith também tem dez moedas
dentro do bolso. Smith acredita em b, e b é verdadeira. Gettier afirma também
que Smith acredita justificadamente em b, dado que a deduziu de a. Apesar de a
ser falsa, Smith tem excelentes razões para pensar que é verdadeira. Gettier
conclui que Smith tem uma crença verdadeira justificada em b, mas que Smith não
sabe que b é verdadeira.
Ora, se não podemos ter
certezas de que conhecemos coisas simples, coisas mais abstratas, como no caso
de Tomás de Aquino sendo Deus um conceito do qual só podemos abstrair
conhecendo a essência das coisas, seria mais difícil ainda considerando tudo
que foi apresentado neste trabalho.
Considerando que o
conhecimento, ignorando os problemas citados acima acerca do mesmo, do
conhecimento das coisas não se faz automaticamente a ligação com o conhecimento
de Deus, mas sim de sua existência, que por si já basta como problema.
Conhecimento de Deus
pela via racional, assim como para alguns filósofos coevos a Tomás de Aquino, se
torna um obstáculo intransponível, pois o mesmo só poderia se apresentar a nós
como acessível mediante à fé e à revelação. Esta relação de causa e efeito do
qual conhecendo as coisas (efeito) encontraríamos a existência de Deus (causa)
nelas segundo Tomás de Aquino. De fato, se a origem de todos os nossos
conhecimentos, ou o que podemos considerar de antemão conhecimento, está nos sentidos,
aquilo que transcende os sentidos é impossível se demonstrar.
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